MEU PAI E A BUSCA PELO OURO
Meu pai nasceu em Ventura, Morro do
Chapéu, interior da Bahia. Criado por seu avô
adotivo, Antonio de Benta, famoso coronel político da região. Famoso
porque consta na História como o homem que formou um grupo de empregados e
capangas para expulsar o bando de Lampião das terras baianas.
Cresceu como vaqueiro, buscando bois
na invernada, enfrentando espinhos e cactos das matas. Estas habilidades o
animaram a participar de um rodeio na cidade de Jacobina, no mesmo estado da
Bahia. Jacobina nesta época começava a se tornar um local de exploração de
ouro.
Foi numa destas idas e vindas a
cidade, para ver minha mãe, que coincidiu com a abertura da corrida do ouro na
região proxima, que ficou conhecida por Serra do Ouro, em terreno pertencente
ao município.
Havia
ali um pequeno jornal que via na extração aurífera a grande oportunidade de
Jacobina se desenvolver economicamente, tornando-se uma cidade civilizada.
Nesse sentido os garimpos jacobinenses ganhariam traços de terra prometida,
cheia de oportunidades, enfatizando os benefícios e a facilidade em se cavar
ouro. Geralmente esses apelos eram dirigidos aos “sertanejos pobres dos
municípios convizinhos”.
Conforme
o jornal dizia, aqueles que atendessem ao clamor dos garimpos, “sem esmorecer”,
seriam bem recompensados, pois nessas áreas produzia-se muito, suficiente para
ser distribuido de modo igual para todos.
COMO
ERA O GARIMPO
Insegurança e insalubridade marcavam
o dia-a-dia dos que se aventuravam na busca do ouro, lavando o cascalho nos
córregos que desciam das encostas, explorando minúsculos veios, ou ainda,
adentrando grunas, cujas formas só lhes permitiam descer, arrastando-se sobre
os joelhos.
A salubridade natural encontrada nas
montanhas era alterada em função do sistema de exploração empregado pelo
processo de garimpagem. Portanto, é óbvio que o meio em que atuavam os
garimpeiros tendia a uma insalubridade progressiva, pois, sofria as ações
predatórias da exploração que independente das técnicas e processos empregados,
alteravam o relevo através do esgravatamento do terreno e perfuração das
serras. A destruição da vegetação e o indiscriminado uso do mercúrio
contribuíam para que o garimpeiro, nos seus sonhos de conforto, produzisse para
si um ambiente pouco saudável.
Tanto os locais de moradia, quanto os
de trabalho não ofereciam ao garimpeiro condições propícias à saúde. Habitando
áreas sem nenhuma infra-estrutura - ausência de água encanada ou sistema de
esgoto, dormindo e se alimentando mal, enfrentando situações de perigo durante
o trabalho e sem atendimento médico - os garimpeiros estavam vulneráveis a
todos os males e na dependência de um serviço de saúde pública muito
deficiente.
Com a seca de 1932, o próprio Estado
da Bahia engajou-se na campanha migratória, facilitando o deslocamento da
população nordestina para o sudeste. Entretanto, em 1936, quando já se
atenuavam as conseqüências da seca, os baianos, por meio de um Comunicado da
Bolsa de Mercadorias da Bahia, publicado no Diário Oficial intitulado “Braços
para São Paulo”, se mostraram indignados com o recrutamento feito por agentes
paulistas.
Alegando que, não satisfeitos com a
contratação dos trabalhadores das zonas do São Francisco e do Alto Sertão do
Estado, esses agentes estavam invadindo as zonas suburbanas contratando não só lavradores
como “operários outros”, com promessas de bons salários e outros auxílios.
Naquele momento, a Bahia precisava daqueles braços “para desenvolver as suas
inúmeras atividades, quer na zona rural, quer na urbana”.
A garimpagem consistia em retirar
cascalho e lavá-lo numa esteira ou usando peneiras com várias telas diferentes,
depurando até ficarem as menores pedrinhas, onde no centro se criava uma mancha
de pedras escuras. Ali, os diamantes sempre se destacavam por seu brilho
reluzente ao sol.
Usava-se também uma bacia de madeira
ou alumínio conhecida como “bateia”, para essa depuração quando se tratava de
ouro. Muitas explorações eram feitas em rios profundos e o trabalho era mais
complicado e perigoso.
Para retirar o cascalho do fundo do
rio, meu pai se enfiava num “escafandro”.
Um capacete de ferro com visor de vidro todo fechado, de onde saia uma
mangueira por onde era bombeado o ar, permitindo que a pessoa respirasse
enquanto cavava o fundo do rio com uma picareta. Depois, com uma pá, enchia
vários sacos com cascalho que eram puxados por uma corda. Um trabalho de
revezamento que permitia a cada homem ficar uma media de duas a três horas ali
embaixo, naquele trabalho estafante.
Só que nem sempre se conseguia
acertar num veio produtivo. Às vezes, passavam-se meses, sem conseguir nada,
nem um “Xibiu” - que é um diamante do tamanho de um grão de arroz, mas
suficiente para comprar pelo menos o alimento da semana.
Quando o garimpeiro era novo na área,
tinha que encontrar algum dono de uma “Catra”, onde havia sinais de depósito de
diamantes ou um veio de ouro. O dono da “Catra” contratava os garimpeiros, “a
meia”, fornecendo alimentos, panelas e equipamentos para a exploração. Depois,
todo o produto do trabalho era dividido entre os garimpeiros, deduzindo os
gastos com a alimentação e ferramentas, além, é claro do aluguel do espaço na
fazenda.
Os perigos maior acontecia em alguns
garimpos mais isolados, quando alguém tirava a sorte grande. Então, o
garimpeiro tinha que reprimir a euforia do momento e disfarçar, colocando a
pedra preciosa dentro da boca ou em um
“picuá” - uma bolsinha de pano, que era
logo escondida dentro do calção.
Às vezes, alguém tentava abrir outra
escavação distante alguns metros, lograva êxito e “bamburrava” - Quer dizer: tirava a sorte grande e conseguia
diamantes maiores e em grande quantidade. Isto incentivava os outros a também
abrirem novas “catras” naquela direção, logrando êxito. Assim, abria-se a
chance de mais pessoas serem contratadas e assim o acampamento virava um
vilarejo, pois a notícia corria e muitas pessoas acorriam para aqueles rincões
em busca de dinheiro rápido. Junto com eles, vinham também comerciantes,
prostitutas e bandidos.
Acampamentos de garimpeiros,
prosperaram, criaram sua própria história e hoje são conhecidos como grandes
cidades como Estrela do Sul, Monte Alegre, Ituiutaba, Diamantina e Fronteira.
As minas de ouro existentes nas cidades de Ouro Preto e Mariana mais famosas
foram logo entregues aos estrangeiros.
A experiência em avaliação de pedras,
o contato com representantes de grandes importadores que sempre iam aos
diversos garimpos, fez com que meu pai fosse contratado como comprador de
diamantes. Passou a ser chamado de
“Capangueiro”- como eram conhecidos estes compradores, que recolhiam e
exportavam estas preciosidades para a Inglaterra e França. Era uma atividade de
alto risco. Sair de um garimpo no meio do nada, com várias pedras valiosas,
dentro de uma “capanga”, era chamariz para assaltantes e assassinos. Isso o
obrigava a contratar capangas armados.
“Capanga” é uma sacola com alças que a gente pendura nos ombros. Feita
de linho ou de couro. Portanto, quando se via uma pessoa portando uma destas
sacolas, já se sabia que havia escolta por perto.
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